6 de abr. de 2025

E foi



Houve um fevereiro em que um ipê amarelo floriu 

Eu não esqueci 

Eu não quero esquecer 

Agora é abril

E um ipê branco floresce 

E eu envolvo a memória em palavras leves 

Para que ela não afunde 

E se perca em um breu infinito 

Algumas belezas vêm assim 

Nas estações erradas 

Fugazes e especiais 

Clamando versos simplórios 

Para que não se percam completamente 

Porque amanhã já não haverá mais flores no ipê branco 

Nem o som de qualquer voz 

Nem o brilho de qualquer sorriso 

Outro momento especial 

Outro momento fugaz

Olá até logo adeus 

Tudo em uma mesma noite 

A alma

Essa coisa tão rara

Entregue sem pensar 

Pois pensar paralisa a vida 

E a vida precisa correr 

Chegar ao próximo ponto 

Ao próximo corpo 

Ao próximo êxtase

É confuso 

Eu sei

E precisa ser simples 

Rápido

Prático 

Substituível 

E foi. 


5 de abr. de 2025

Venta muito por aqui



O outono sempre impregna as manhãs com uma espécie de magia ancestral

O vento não apenas sopra 

Ele dança 

E canta 

Uma valsa deslumbrante 

Uma canção repleta de renovação 


São novos dias 

Ele me diz

E parte em seguida

Sem maiores explicações 

Mas então o calor no peito 

E o coração desejando também cantar e valsar 


Ainda há o medo 

Isso é certo

Incômodo e severo 

Sempre ali

Em um cômodo sujo e escuro 

Aguardando a menor falha para me dominar 


Só que hoje venta 

Venta muito por aqui 

E são carregados e espalhados pela atmosfera 

Os incessantes sussuros fantasmagóricos

Que roubam a luz 

Roubam a melodia 


E eu respiro aliviado por uma estação 

Lembrando de um verso que dizia 

Que Deus protege os inocentes 

Pensando que talvez por hoje 

Ele também proteja 

Os que tiveram a inocência roubada.

14 de mar. de 2025

Livres



A profunda beleza do mundo lembra-me da face de Deus 

Quando meus olhos são impuros demais para vê-la diretamente

Há essa mãe que todos os dias passa segurando o filho fortemente para que não caia 

Há essa forma como a luz atravessa a copa das árvores pela manhã

Anunciando o fim da escuridão da madrugada e seus pesadelos 

E por entre esses 

Há o sonho impossível 

O olhar 

O calor 

O toque

O corpo

A alma

As mãos dadas

Há ainda a dor ancestral com suas centenas de significados 

Fazendo com que hoje eu sinta 

Que foi preciso perder você 

Para não me perder depois

E há essa canção 

Que é também a voz de Deus 

E que nos faz querer dançar 

E dançando 

Estamos livres.

12 de mar. de 2025

Livros em promoção

 Até 17/03 todos os meus livros estão com até 35% de desconto no Clube de Autores.

Acesse pelo link: 

Clubedeautores.com.br/books/search?where=books&what=Marcos+Serafim+Teixeira+





6 de mar. de 2025

A gente vai vivendo assim...

 

A gente vai vivendo assim...

Chegando tão perto de um prêmio inatingível 

Imaginando como seria se naquele domingo não se tivesse ouvido um adeus

Sonhando com o tempo em que não era preciso saber tanto

Mas em que se sentia muito 

E o universo era do tamanho do quintal lá fora

E o futuro todo

Do tamanho de apenas um amanhã 

A gente vai vivendo assim...

Crescendo e não tendo mais um adulto para trancar a porta de noite 

Para dar remédio para o gato 

Para reclamar com o vizinho da sujeira deixada na sua calçada 

A gente vai vivendo assim...

Não pensando no que virá para não sofrer 

Não pensando no que se foi para não sentir saudade

Tomando cuidado para não se apaixonar pela dor

Quando ela é tudo o que resta de algo amado que se foi

A gente vai vivendo assim...

Meio que sem viver de verdade 

Deixando poemas inacabados porque ninguém os lerá mesmo até o fim 

Dormindo antes de conseguir sonhar porque logo as horas rugirão

Silenciando aos poucos as palavras porque elas já não alcançam outros corações. 


22 de fev. de 2025

Memórias e consequências

 


Passados tantos, tantos anos 

Eu começo a questionar se aquele sentimento 

Que era tão grande

Que era quase maior que tudo 

Realmente existiu 

Já que agora restam apenas lembranças e consequências 


Nenhuma prova da existência da imensa luz 

Que irá se apagar por completo 

Pouco a pouco 

Junto da extinção da minha memória 

Que lentamente vai me deixando 

Apenas com alguns pequenos estilhaços de encanto 


Nunca

Ninguém mais atravessou aquela mesma porta

E eu me perdi e precisei me encontrar 

De mais formas do que posso contar 

E as cicatrizes que só eu vejo 

Já quase me impedem de reconhecer meu reflexo 


Então eu sangrei ao falar sobre o profano invadindo o sagrado 

Então eu orei para anjos de nome desconhecido 

E eu tentei, tentei 

Até ser julgado por tentar demais 

E eu desisti, desisti 

Até ser acusado por ter desistido.

 

11 de fev. de 2025

Meu coração ainda bate

 



Versos ancestrais pairam displicentes...

'E havia você...

E por haver você é que havia o céu e a claridade das estrelas. 

Sorríamos ao firmamento, 

Lado a lado, 

Como se a realidade fosse o pesadelo 

E ali é que estivéssemos acordados.'

Nada foi maior desde então

Maior que aquele céu 

Que aquele sonho 

Não que nenhuma outra beleza tenha despontado no mundo

Ainda ontem o coração acelerado 

As pernas bambas 

Doces fragmentos de outras memórias 

E a lembrança da pergunta

"Me diga, você conseguiu amar outra vez?"

Sim, eu disse, é claro 

Mentindo 

Mas também falando a verdade 

Porque amei 

As palavras que não foram contaminadas 

As canções que nunca silenciam 

O jardim da alma que sobrevive à estiagem 

Que não tem previsão de fim

E essa fagulha de fé 

Que quando está prestes a se apagar

Renasce 

Talvez não deslumbrante como uma fênix 

Mas ainda bela

Feito um colibri 

'Meu coração ainda bate...'

Eu deveria ter respondido 

Seria o suficiente 

Porque para algumas questões 

Não existem respostas óbvias 

Meu coração ainda bate...

Por isso ontem doeu 

Por isso hoje eu choro 

Por isso amanhã voltarei a sorrir. 

2 de fev. de 2025

Levitar




Ainda que muito pouco 

Reles centímetros apenas

Nos sonhos é possível levitar 

E os monstros famintos 

Emaranhados com a noite escura

Já não nos alcançam 

Embora estejamos cansados de lutar 


Enquanto na realidade 

É domingo 

E paira um silêncio quase imaculado

Que por instantes 

Cessa os estrondos incessantes da mente 


Então chove 

E eu me lembro de quando as chuvas acalmaram as batalhas 

Lavava o sangue dos campos 

Fazia embainhar-se as espadas 


Então chove 

E as águas levam lentamente 

As últimas luzes do dia 

E as águas lavam delicadamente 

Dores, medos e memórias 

Que nunca fazem a bondade de partir.

25 de jan. de 2025

Fio de esperança



 Às vezes após as tempestades 

O ar se preenche de um perfume peculiar 

Igual ao que pairava 

Aos arredores daqueles velhos parques de diversões da infância 

E por um micro espaço de tempo 

Abrem-se as portas e janelas desse quarto sufocante 

Em que a realidade nos aprisiona 

As palavras então deslizam rua abaixo 

Como as águas purificantes 

Palavras não observadas 

Ignoradas 

Mas ainda quase belas 

Como as dos leves dias de outrora 

Sei que como os relâmpagos distantes 

A vida promete estações mais cruéis que esta 

E eu me vejo lá sem outra mão 

Sem outro sorriso

E dói 

Mas hoje há essa atmosfera limpa 

Uma canção bonita sobre saudade

Um último fio de esperança 

Sustentado pelos sonhos infantis 

Que ainda resistem.

Feito teu coração

 


Talvez as lágrimas dos cantos de teus olhos 

Não sejam assim tão tuas

Como os relâmpagos distantes 

Sejam sussurros de uma atmosfera alheia 

Que apenas roga pelos teus sentidos que ainda resistem 

Talvez um dia 

Nos reflexos que tanto busca 

Veja mais do que medo e passado 

Ao invés disso 

Olhando através das janelas e alpendres 

Veja futuro e esperança 

E entenderá que às vezes é preciso deixar ir

Às vezes é preciso desistir de algumas flores 

Para que o jardim fique mais bonito 

Então veja lá fora 

O céu de infinita escuridão 

Continua pontilhado de estrelas 

Feito teu coração.

19 de jan. de 2025

Você pode



Se eu pudesse

Eu traria de volta aquelas palavras 

Que eram como gotas de cura 

Ou traria o silêncio 

Que mesmo sendo frio e dolorido 

Era belo e puro como um diamante 


Se eu pudesse 

Eu mesmo seguraria sua mão

Através dos dias sem fim

E ela nunca mais tatearia na escuridão 

Buscando a porta de um abrigo 

Que nunca existiu 


Se eu pudesse 

Eu perdoaria seus pecados 

E te ajudaria a semear sonhos

Ao invés de culpas 

Te ajudaria a ser forte

Ao invés de pedir socorro


Se eu pudesse 

Eu te amaria mais

Para que esse amor bastasse 

Para que a falta de nenhum outro amor doesse

Para que você sentisse que na verdade 

Tudo isso, você pode.

12 de jan. de 2025

Te tola e bela forma

 

De tola e bela forma

Vejo-te tentar construir novos sonhos 

Sobre escombros pontiagudos 

Que nunca se dissolvem

Que nunca desaparecem 

Quase feito uma criança 

Que se esqueceu de perder a esperança ao crescer 

O espírito diz então que ainda é cedo 

Enquanto a mente diz que já é muito tarde 

E você apenas tenta fugir da guerra ininterrupta 

Entre a fé e o medo 

Tentando se refugiar em memórias etéreas 

Em promessas que não se cumprirão...

2 de jan. de 2025

Uma versão sua



Existia uma versão sua 

Que sabia tão bem sorrir e amar 

Ainda que com dentes tortos

Ainda que com amores ilusórios 

Uma versão sua 

Que sabia tão bem 

Dançar e cantar 

Ainda que errando os passos

Ainda que desafinando o tom

Uma versão sua que já quase não se mostra 

Que quase não existe

Mas que em algumas tardes

Quando a luz do sol incide sobre os escombros de tempo 

Que foram se acumulando cruelmente sobre você 

Essa sua parte brilha lá no fundo 

Entoa uma canção sobre estrelas e heróis 

Ensaia alguns movimentos tímidos 

Arrisca mais alguns versos

E diz com uma voz tímida 

Que sim

Talvez os escombros já sejam pesados demais para serem removidos 

Talvez muita coisa não consiga mais ser curada 

Porém 

Uma nova versão pode enfim nascer 

Ainda maior e mais forte

Uma versão sua que o tempo não irá soterrar 

Uma versão sua que sabe

Que a luz no fim do túnel 

É você mesmo.

1 de jan. de 2025

É preciso

 

A cidade ainda dorme 
De certa forma
Um sono justo 
Como os advindos 
Do após de grandes batalhas 

A cantoria dos pássaros é amena
Ecos solitários de uma alegria fugaz 
Delicados como pequenas orações confusas 
As nuvens movem-se em calmaria 
Ocultando aos poucos a luz clemente 

É preciso que se fale sobre a esperança 
Sobre a paz
É preciso que se fale sobre reconstruir o que foi quebrado 
É preciso que se chore rápido pelo que partiu 
Para que se sorria para o que vai chegar 

É preciso que se agradeça 
Que se louve 
Que se abrace 
Não é preciso muito...
É preciso que se ame.