22 de mai. de 2022

 



Há ainda em alguns inícios de tarde, embora o azul magnânimo e clemente do céu, essa chuva branda de delicados fractais dos tempos em que o tempo não passava. 

Esse suave perfume da jabuticabeira em flor, a memória dos velhos papéis de carta, a luz do sol se diluindo por entre as árvores, resgatam dos porões trancados da memória o aroma do primeiro amor, o aroma dos primeiros sonhos que exalavam vida por todos os poros... E eu sempre achava que recebia demais, que já era muito meu amor ser tolerado, e não celebrado; eu sempre achava que as flores floresciam pelo acaso, e não pelas minhas mãos que se feriram na terra ao semeá-las, não pela minha fé em cultivá-las mesmo quando era inverno e todas as cores pareciam tão cansadas.

São apenas os primeiros passos nessa estrada infinita...

São os primeiros minutos de claridade após a madruga... 

Tudo o que amei ainda está aqui, repousando agora bela e inofensivamente, 

Mas é o que eu finalmente amo que verdadeiramente me guia,

O coração

12 de mai. de 2022

 

O sol nasceu já era meio dia. 

E esse calor tardio é o mais próximo de um abraço em dias, ou séculos. 

E isso é apenas meu dedo traçando mensagens em códigos tolos sobre a areia, segundos antes de ondas suaves tudo levar. 

E é apenas uma forma de novamente urrar de lábios selados, de rogar socorro a fantasmas frios e acariciar as cicatrizes das batalhas que venci, ou que perdi, não recordo bem.

Ainda é cedo, dizem, mas eu já ouço a cantiga do tempo. . . 

Um ruído ininterrupto que quase se sobrepõe às melodias adocicadas dos tempos dourados. 

Ainda é cedo, insistem, mas ao redor daquelas memórias ternas; os joelhos na estrada de terra, um anel prateado, dois sorrisos; já há uma bruma escura e densa de esquecimento. 

Todas as vozes que sobraram confundem verdades e mentiras em seus discursos intermitentes. 

É um cenário intrigante... a realidade:

Às vezes eufórico, quase sempre cansativo. 

Esses fragmentos de encanto, esses sopros de esperança, essas pequenas belezas que desabrocham como flores azuis, são o alimento pouco nutritivo para o espírito que já degustou nuances do paraíso. 

Mas então veja: as ondas já vêm para levar meus rabiscos novamente. 

Antes delas chegarem eu vejo o vento começar a desfolhar as árvores e com o olhar pausado em um horizonte próximo demais eu tenho a certeza de que hoje pertenço a outro lugar. Mesmo que não outro lugar físico, mas outro estado de alma, outro destino. 

Então o oceano das horas engole meus devaneios, dissolve as lamúrias e cores junto ao seu sal infinito... 

Um dia eu entenderei que, na verdade, o oceano sou eu.

7 de mai. de 2022

 

Aquela mensagem desbotada no alto do caminhão, a quem passava:

"Acredite!";

O homem correndo com um botão de rosa nas mãos, com um pequeno laço esvoaçante ao vento,

Um gesto de doçura, 

Talvez para uma mãe cansada

Ou para um amor delicado;

Um olhar ligeiramente mais profundo, 

Meu nome em finos lábios gentis...

Talvez fosse Deus,

Do Seu Misterioso e Santificado jeito,

Provando aos meus sentidos,

Ao meu espírito,

Que a brutalidade dos tempos que passaram,

E que insistem em permanecer,

Não pôde dizimar todas as pequenas esperanças,

Os pequenos milagres,

E estes brotam pelas frestas dos dias amenos,

E florescem aos poucos,

Colorindo, 

Aquecendo,

Salvando...

E meu coração deixa de se esconder,

Por um momento,

Deixa de doer,

Por um instante,

E me responde:

"Sou grande, 

E permaneço forte ainda."