25 de abr. de 2012

Paisagem



O que pesa tanto?
Nem é a vida viu, é essa alma de esponja que absorve tanto...
Isso sim cansa.
O chão nem parece mais concreto, a gente vai andando como se deslizasse, como se fosse água que não pensa, mas continua escorrendo pro lado certo, ou obrigatório.
O céu também nem parece céu, parece teto, de tão próximo. 
Azul pálido, de nuvens paradas, sem vida. Nem faz diferença.
Nas ruas os carros e motos passam com bandeiras presas. Hoje tem jogo do time da casa.
Uma coisa que sempre me arrepia e quase emociona é ver uma bandeira bruxuleando; qualquer bandeira, por qualquer motivo. Bandeiras representam fé em algo, e a fé é sempre bonita, mesmo que seja em algo tolo.
Não tenho sentido fé.
Mas não por deixar de acreditar, acredito nas mesmas coisas de sempre, e talvez até algumas a mais.
Mas fé pra mim é sinônimo de calor, e eu tenho sentido frio.
Saber que as coisas existem nem sempre é o bastante.
Que ser-humaninho insaciável sou eu. Lamentável.
Só não estou pra escolhas duras, só isso. Tudo bem?
Não espere grandes feitos nesses meus tempos áridos e quase frios.
Escolherei o caminho mais indolor dessa vez, o mais fácil possível.
Ainda não recuperei todo meu sangue... Não que tenha derramado muito, mas é que me corre pouco demais nas veias.
Tudo tem sido uma pintura, uma quase-obra-de-arte.
Talvez uma pintura Impressionista. 
Reluzente, verdadeira, mas sem lógica.

21 de abr. de 2012

Retratos


Gosto de olhar as gotículas de vapor dentro do copo de café.
Gosto dos perfumes nas roupas.
Gosto de ouvir a canção da chuva, umedecendo meu coração quente e seco com sua melodia de criança.
Meus caminhos novos são exatamente os mesmos que em que já tanto pisei.
Os cortes são sempre sobre as mesmas cicatrizes.
Minha memória quando quer sentir medo retorna aos mesmos pesadelos em que eu ficava preso na mesma esquina entre dois nadas.
Mas nesse meu estranho Jardim Secreto, algumas insanidades são tão bonitas.
Maravilhas brotam por entre as árvores mortas.
E é tão bom quando nós conseguimos sentir saudade e desejo.
É tão bom quando nós sonhamos nossos sonhos tolos.
Vou me apaixonando pelos silêncios, pela paz e pela calma.
E eu vou esperando cada vez menos, vou ansiando cada vez menos, vou me bastando.
Um barquinho num lado de espelhos, a chuva chovendo...


São retratos do meu mundo, 
do mundo.

19 de abr. de 2012

O infinito cabe num segundo

Apenas outra vez essa língua amarga.
Nada de palavras, nada de canções...
Nadando na própria saliva de fel.
Escondida por esses mesmos lábios finos e sem sabor, na mesma boca que devorou minha luz.


Parta-me!
Talvez eu volte a brilhar!


O que foi?
Os sonhos em penumbra, neblinados, as dimensões rompidas?
Medo, voracidade, luxúria?
A beleza tão sublimemente fútil dos diamantes falsos...
Sem sol, nuvens. Por pouco, sem céu.


De repente o infinito cabe num segundo.
Mas o segundo passa e deixa nosso amado e velho inimigo.
Claro, o Vazio.
O que mais?
Mas agora, não o vazio de certezas ou quimeras, já não fazem diferença.
É puro vazio de si mesmo.



9 de abr. de 2012

Fio de Luz

Como dois poços profundíssimos, em cujos fundos repousam o brilho da luz de uma vela; estes estão meus olhos.

Dois círculos negros, com uma janela aberta ao nascer do sol cada, bem ao centro.

E nesta tarde, a própria escuridão tamanha do meu espírito torna minhas reles faíscas de claridades muito mais evidentes e deslumbrantes. Ao menos para mim mesmo. Quem sabe, talvez, para algum outro ao redor.

Porém não minto, tenho sim espírito de sombras.
Tenho pele frágil, coração fraco.
Mas tal qual rocha feia e fria, tal qual qualquer outro um; pode haver, deve haver, tem de haver, algo de valor incrustado no âmago. Em meu, no seu, âmago.
Que seja esse mísero fio de luz incandescente.

Estou de pé agora, ouvindo novas canções, saboreando um doce carinhosamente oferecido, lembrando que todas as manhãs, na primeira esquina em direção ao trabalho, existe um campo com poucas árvores, com o chão coberto por flores simpaticamente azuis, esta visão é como uma prece sem palavras. Estou de pé agora, lembrando da imensa paineira toda, toda florida nesse início de outono (esta que fica algumas ruas abaixo do campo de flores azuis)
Estou de pé agora... e é linda a paisagem daqui de cima.
É certo que esta claridade não durará, assim como aquela escuridão não durou.
É certo, porque nem as rochas são eternas; são elas esse pó que se acumula sobre nossos móveis e sonhos.
(Só o que é feito de amor e por amor o é, e mesmo assim somos miseráveis diante da imensidão dele. Quantas vezes, ainda que completamente imersos nele, nos damos ao luxo de sentir dor.)
E não, não estarei mais forte quando a luz apagar, não estarei menos assombrado pelos fantasmas que nunca se despedem completamente.
Não, porque raras vezes o que não nos mata nos torna mais fortes. (Esse é um ditado bobo, como todos e quaisquer outros ditados; termos fortes, pouca verdade.)
Não raro, o que não nos mata, nos fragiliza.
Porém, por outro lado a fragilidade é uma benção.
A fragilidade recorda os humanos a importância de se ser Humano.
A fragilidade nos torna lentos e lentidão nos faz pousar o olhar sobre o pequeno, sobre o detalhe, e grande parte das vezes os detalhes são os sorrisos de Deus.
E acredite, não há nada mais belo do que ver Deus sorrindo.