28 de mai. de 2011

As duas coisas ou O despertar



Talvez pareça muito o que quero,
Mas meu muito, comparado a outros muitos, nem é tanto assim...
São apenas duas coisas:

Coisa 1: Parar de temer a mim.
Os outros medos que continuem, tudo bem... Mas eu, eu represento grande perigo a mim mesmo. Como uma bomba-relógio cujo contador de tempo está quebrado. Pode explodir em três minutos, ou nunca explodir, ou explodir em um ano. E continua essa guerra de qual dos meus eus pode mais. Eu gostaria bastante de fazer as pazes comigo, porque existe tanta coisa boa que pode nascer desse acordo... uma vida de verdade, por exemplo.

Coisa 2: Nem seria necessário dizer o nome dela, mas sim, é claro que é o Amor. A mesma coisa que sua tataravó mais queria e a mesma coisa que seu tataraneto mais irá desejar. Sim, o Amor. Sempre o Amor.
Porque eu já cultivei muitas flores e chorei na presença de Deus e ajudei velhinhos atravessarem a rua e já disse ‘vai ficar tudo bem’ e fiz tudo ficar bem e já tentei vencer e já perdi e já venci e já escrevi milhares de versos e já percorri sozinho centenas de alamedas desertas e já fotografei dezenas de pores-do-sol, mas nada disso se perpetua dentro de mim, tudo isso desaparece, se torna pó na brisa, porque ele, o Amor, me falta; sim aquela manifestação mais frágil e infantil dele, (um bombom, um bom-dia, flores, sorrisos, etc...) aquele pequeno calor íntimo ao se lembrar de um abraço, um beijo no canto dos lábios; as borboletas no estômago, o sono confortável à noite, os sonhos na madrugada, ainda me faltam.
É como se nada no mundo fosse belo o bastante se ele não existe. E como posso estar tão certo disso? É que numa breve certa vez cheguei quase a pensar que ele era real pra mim, e nesse dia eu vi tanta luz, tanta claridade que foi como se minha alma estivesse em chamas dentro de mim. Foi como correr num campo de girassóis onde todas as flores eram na verdade pequenos sóis. Mas então houve o despertar, e eu estava só, comigo mesmo me olhando com aquele sorriso diabólico e sedutor: “Venha e curta a noite escura...” eu me digo. E eu me obrigo a ser pequeno, envergonhado, outra vez. Eu me obrigo a calar as vozes que vêm do peito (a fé, a esperança, o sonho) outra vez.
Então já sinto que é tão tarde e começa a esfriar tanto e venta muito e estou exausto, quero apenas pegar minhas coisas, levantar do chão da porta do paraíso e voltar pra casa, onde tudo é composto pela mesma natureza medíocre que a minha... onde eu posso me camuflar, não ser notado por nada, e principalmente, nem por mim mesmo.

25 de mai. de 2011

Questão de espaço



E o que mais fere é essa sede,
Essa secura que se alastra pelas minhas entranhas.
Também fere sonhar contigo caminhando em minha direção,
Caminhando, sempre caminhando sem nunca chegar.

Mas já não é bem a falta de um você, mas a falta de um eu.
O que me falta é minha alma, a qual corre tanto de mim,
a qual quase nunca alcanço.
E quando/se alcanço vejo que ela não cabe dentro de mim, de imensa.
E ainda preenchi-me de tanta ilusão, de tantas noites estreladas,
de tantas juras falsas, de tantos invernos secos...
Preenchi-me tanto que já não me caibo mais em mim.

O que preciso de ti são suas mãos e olhar.
Suas mãos para ajudar no esvaziamento, seu olhar para reaver a fé nos milagres.

Oferece-me então, por favor, um bocado da sua força que vejo ser tão grande; apenas um bocadinho.
Venha, às vezes, em silêncio e vá tirando os entulhos de mim;
não precisa ter pressa.
Jogue meus restos, excessos, pelos jardins...
E antes de partir, olha-me.
Só olha-me, como fazes agora que nem ao menos sei teu nome.
Continua olhando-me como se tivesse fome do que há em mim,
do que sou.
Então vá.

Então volte.
Porque um dia ei de caber em mim, e eu terei tanto, tanto a lhe retribuir.
Então volte.
Porque serei cura, serei intenso e vívido.
Então volte.
Porque não encontrarás por aí outro eu mais belo e mais forte que o meu.
Então volte.
Porque serei refúgio firme e sagrado,
e serei seu.

22 de mai. de 2011

Aço e flor (parte l)


O pouco que te ofereço é sim verdade.
Pura verdade.
Às vezes até perfumada verdade.
O que te ofereço não mente, não trai, não peca.
É puro, risonho, límpido.
O que te ofereço é calmo como oração,
Doce como bala de iogurte,
Gostoso como torcida feliz no fim do jogo vencido.
O que te ofereço vem das próprias migalhas que Deus derrama pelos caminhos que percorro.
Tudo o que sinto é de uma realidade irrefutável,
Cada cor, cada som, cada pétala, cada aroma.
Todos os sentimentos que eu entregar em seus braços são filhos legítimos meus, fecundados por um amor sublime.

Frio sou eu, EU mesmo.

Não confie tanto em mim.
Não acredite tanto no que dizem ao meu respeito.
Não se maravilhe com uma luz que não possuo, com asas que não me desatam do solo.
Pois sou uma alma de metal, apenas condenada a gerar flores.

Eis minha benção dos Céus: gerar flores, quando posso.

Porque hoje eu me vejo morto em mim.
Duro.
Um Jardineiro Fiel, automático, laborando com maestria sua sina.
Uma escultura de aço, imutável, solitária,
Carente de vida.

Aço e flor (parte ll)


Mas se por acaso, você conseguir me oferecer de volta aquilo que te ofereci,
E se isso me emocionar ao ponto d’eu, por eu mesmo, enxergar ali uma fagulha de esperança nos homens, sinto que ainda poderei ser salvo.
Pois se um dia o sentido da minha vida foi buscar única e exclusivamente o amor, é porque algo dentro de mim é gerador de luz.

Então ajuda-me!

Traga-me uma rosa, um perfume, um nascer de sol.
Traga beija-flores, muitos deles,
E borboletas e a Banda Mais Bonita da Cidade cantando “Oração”.
Dá-me um beijo, que seja apenas um, único, mas que seja de bastante sentimento.
E sorria pra mim e me leve às cachoeiras numa sexta qualquer,
Diga-me que sou amado; eu sei, é egoísta pedir isso, mas diga assim mesmo,
Porque reconheço-me como miserável criatura, mas ainda sim, criatura divina; sei de onde vim.
Acima de tudo, traga-me sonhos, pequenos, grandes, ínfimos ou imensos.
Traga-me acima de tudo sonhos!
E mais por cima de tudo ainda, sonhe junto de mim, ao lado meu.

E abraça-me, abraça-me como meus amigos mais íntimos,
Tão íntimos que já se perderam dentro de mim e já fazem parte d’eu.

Faça-me sorrir, sorrir mesmo que seja num primeiro de junho quando voltarei para o emprego que não gosto.
Mesmo que seja numa segunda-feira modorrenta onde às 5 da manhã terei um despertador desesperado ao lado da cama.

Ajuda-me, por favor, a ser Homem real,
de carne, sangue e olhares.

Então, sintamos-me,

vivo.

16 de mai. de 2011

Precauções e recompensas


Primeiramente, tome cuidado com essa luz que vê.
Ela não vem da porta aberta de um coração forte,
Ela vem das rachaduras dum coração que há muito vem se esfarelando.
Tome cuidado com as flores que germinarem graças a essa luz,
Elas foram aguadas com lágrimas salgadas e seu perfume pode estar contaminado.

Fuja dessa luz antes que ela se apague, e seja tarde demais para voltar.
Fuja enquanto a noite não desce, sedutora, e tira sorrindo dos teus olhos o brilho da esperança.
Fuja, porque a ausência de um culpado não inibirá a existência da dor.
A dor... essa meretriz de quinta categoria, espaçosa, mal cheirosa; adornada com brincos, colares e anéis de sorrisos decepados.

Esquiva-te desse coração, que é planta carnívora e faminta...

Esquiva-te e vá direto ao espírito, vá direto à verdade.
Abra as janelas e ligue todos os ventiladores, comece a lustrar os tesouros adormecidos...
No espírito sim, aconchega-te e acalma-te. Pois ele não trai, ele não atua, ele não finge.
Alcança o espírito e de lá, com luvas nas mãos, comece a remendar o coração.
Fragmento por fragmento, caco por caco, peça por peça... até que ele esteja de volta à sua forma original.
Então banha-o em luz de sol, em brisa noturna, em chuva de primavera. Banha-o com sorrisos de crianças, com simplicidade e sabedoria de idosos, com carinho de amigos.
Depois deixa-o descansar por instantes...
Devolva-o ao seu lugar.
Espere.
Ele voltará a pulsar, e a fluir a vida por todos os membros,
bate então na porta, que ela se abrirá.
Adentre agora sem medo, ele está curado enfim, e pronto para frutificar pomares de felicidade. 

15 de mai. de 2011

A estória de Enzo (fragmento inicial*)


- Lembro-me de uma ponte, e um rio muito bravo; muitas pessoas num ônibus velho.
- Nada mais?
- Nada mais. Nada além de tudo o que vivi depois disso.
- O que você viveu, e onde viveu?
- Já não sei se realmente vivi... olhando tudo isso que agora está ao meu redor, já não sei se realmente vivi. E o lugar, queres mesmo um nome?
- Seria bom para começar.
- “País das Maravilhas”, “Terra do Nunca”...
- Você precisa levar isso mais a sério.
- Você também.

- Você acha mesmo que estou à vontade aqui?
- E por que não está?
- Porque você não me conhece, não me ama, não sabe nada do que existe dentro de mim. E a única razão para me ouvir, é a boa quantia que vou deixar na mão da sua secretária frustrada quando eu sair.
- Se não quer estar aqui, por que está?
- Por que meu chefe me obrigou. Ou me consultava com um psiquiatra, ou era demitido.
- Você não respondeu minha pergunta.
- Você não entenderia, ninguém entenderia.
- Tente.
- Isso é perda de tempo...
- Pode ser que sim, pode ser que não. De qualquer forma, você ainda tem uma hora.
- Você já ouviu aquela expressão: ‘gostaria de dormir vinte anos’?
- Não...
- Que seja. Pois bem, eu dormi vinte anos, melhor, sonhei por vinte anos, e agora acordei sem 
fazer ideia de onde estou.


*"A estória de Enzo" é um projeto que tenho em mente ainda sem rumo certo. O mais possível é que venha a ser um conto sobre o que julgamos "fantástico". Um homem aparece num consultório psiquiátrico dizendo ter despertado vinte anos depois de um sono profundo, no qual viveu num mundo místico e maravilhoso.
Ainda não sei se esse "embrião" ira vingar... mas o diálogo acima seria o início dele.

Aceita


Aceita minha mão se tem na alma vontade de caminhar, fluir, flutuar...
por entre entre os frios, por entre as brisas e lua.
Aceita minha mão se é doce de espírito, simples de coração, humilde de olhar.
Aceita meu abraço se o silêncio já não é mais tão boa companhia.
Aceita meu abraço se tua cabeça precisa de um ombro para se assentar.
Aceita meu peito magro se falta-te repouso, 
e não julgue por fora o tamanho do meu coração.
Aceita meu peito se deseja o som desritmado e confuso dum músculo ora carente, 
ora mergulhado em paixões.
Aceita meu corpo se se faz nevascas em sua alma; 
aceita meu pouco, meu ínfimo sangue quente.
Aceita meu corpo se carece de abrigo, 
pois como um, seremos fortes aos temporais; pois que só, eu sou oco, e você, indefeso.
Aceita minha alma se necessita do sentir, 
se necessita de pontes, asas, flores, pedras e aromas.
Aceita minha alma se lhe ainda for importante conhecer outros reinos, 
outros paraísos, ou purgatórios.
Aceita a mim, e salva-me...
Depois devolva-me, para que eu te salve.

10 de mai. de 2011

Plano B


Minhas rotas estão esburacadas,
Meus planos A fluíram por rio abaixo.
Talvez esteja próximo da hora de entender que não bastará uma canção para salvar minha vida.
Que não bastará um olhar para trazer sentido a ela,
Que não será suficiente uma bela fotografia para manter acesa minha fé.
Talvez seja hora de eu entender que nunca serei um deles,
Que não importa o que eu faça, se continuar sendo o que sou, sempre irei me sentir mil anos-luz atrás de qualquer um.

Deve existir algo dentro dessa minha alma, algo além das minhas fantasias de bailes imaginários, algo forte e poderoso.
Algo que pode reluzir.

Até quando continuarei esperando a chuva cair para que eu seja preenchido com a presença de Deus?
Há meses não chove...

E embora eu tenha acordado hoje, e a primeira imagem em minha mente tenha sido o silencioso e doce olhar daquele belo rapaz,
E embora ele esteja começando a caminhar com passos lentos pelas trilhas sinuosas dos meus desejos,
Eu sei que ele não é real,
Assim como todos os antecedentes a ele também não foram.
Eu sei que continuo não me sentindo bom o bastante para os sonhos que eu mesmo arquiteto.

Eu só gostaria de saber do que ainda tenho tentado tanto me salvar...
Se já não olho para os pecados do passado e já me perdoei por meus mergulhos em escuridões... do que tento tanto me proteger?
Talvez seja medo de assumir que finalmente sou livre para ser exatamente aquilo que eu queira ou não ser...

Então o Plano B é: apaixonar-me. Seja pelo que for, o quanto for.
Apaixonar-me, até mesmo mais que amar.

Porque o amor é um constante, e parece recusar inconstantes como eu.
Mas a paixão... essa deve saber dançar no meu ritmo.

7 de mai. de 2011

A última flor morreu

Eu sinto sua falta, ainda sinto,
Mas essa falta já não dói mais; ela não grita, não geme, não soluça.
Eu sinto sua falta sem que no fundo ainda espere por ti,
Por isso temo...
Temo amar a ideia de tua existência,
E não um “você” que possa, um dia vir a ser real.
Temo estar apaixonado mais pela pequena janela pela qual observo o mundo,
do que o próprio mundo.

Eu reviro fotografias, canções e poemas vazios.
Eu escavo jardins e semeio flores,
Eu blasfemo, giro, oro e canto...
Tudo pela busca desse sentido que nunca tive provas de existir.
Apenas sei dos milagres que acontecem distantes, como os clarões e relâmpagos de raios que nem ao menos ouço a queda.

Vasculho em todos os olhares, mas sem esperança.
Componho tantas canções, mas não haverá voz para elas.
E meu sorriso é um lago raso, fácil de secar.

2 de mai. de 2011

É você, Papai?

Posso dizer que estou num limiar entre dois abismos,
Um iluminado, em tons quentes, com pessoas que sorriem,
Há uma floresta de árvores novas, e o vento move os capinzais.
Há um moço bonito, com os olhos tampados por fitas pretas, contanto até quatro...
Ele tem uma risada muita feia, mas sua voz é muito doce; me sentiria seguro ao lado dele.
O outro abismo é frio, e há muitos serres com máscaras e suas vozes são grosseiras.
É tudo tão feio e mal iluminado...
Há um homem de pele muito branca e olhos negros que tomam boa parte da face,
Ele me assusta muito.

Perdoa-me, Papai, se tantas vezes não sei ouvir sua voz e ameaço me precipitar no lado negro de mim,
Perdoa-me se não entendo que você moveria todos os sonhos para virem ao meu socorro,
Perdoa-me se não acredito que neste instante eu sou tudo o que você precisa que eu seja.

É você, Papai, vindo pessoalmente ao meu resgate?
É seu canto, suave e gostoso como o dos beija-flores, que envolve todos meus soluços e transforma-os em pequenas canções?

Eu prometo-te não desistir de nós tão facilmente,
Aqui, nesta noite tão fria, às 22:47.
Prometo-nos, Papai, continuar falando das flores,
E das chuvas e do amor, porque alguém há de me ouvir,
Alguém há de colher um pouco de você nos jardins que eu plantar.
Eu prometo, Papai, sair ao sol amanhã, e sorrir para um completo desconhecido.
Eu prometo, lutar outra vez por nós.

Porque você respondeu, Papai!
Você respondeu...

Casulo

Eu sei que minha voz nunca emocionaria teu coração,
Eu sei que teu perfume nunca adentrará por minhas vias e aniquilará cada pensamento bandoleiro que no âmago de mim reside.
Eu sei que você é distante de mim... tal qual eu sou do voo.

O que eu teria de ti além de uma fria fotografia muda?

Há tanto dentro de mim, anjo de rosto imaculado.
Há tanto que preciso dividir, espalhar, oferecer...
Mas pedem-me apenas o que tenho de mais pouco,
Apenas pelo meu sangue mostram interesse.

Por aqui não se faz silêncio há anos...

E eu continuo implorando pela chuva, pelo frio.
Continuo desejando que exista ao meu redor o que se desenha dentro de mim.
Eu continuo esperando pela chuva, e essa é uma espera de covardes,
Pois penso que a chuva me manteria dentro de mim mesmo; me pouparia de idas ao portão, à rua, à vida; sem ter que exprimir explicações quanto à minha desistência...

É tão cinza, às vezes, dentro de mim.