31 de jul. de 2015

Glacial



Ainda amava.
Deus!
Nada mais que um único ano se completa,
Rápido e insolente,
Mas para o espírito esquecido,
Fora o início de uma longa era glacial,
Que o vem tornando mais frio e rígido
Que o próprio corpo que o abriga.

Ainda amava,
Ainda assim.
Como se fosse possível
Um amor tão belo resistir
Em um mundo agonizante;
De escassa poesia,
De dores medievais,
De distâncias agora intransponíveis.

Ainda amava,
Embora nevasse...
Nevassem dias insólitos,
Na realidade, idênticos;
Nevassem silêncios,
Numa existência que já fora canção;
Nevassem adeuses
Sobre o ancestral jardim de sonhos.

29 de jul. de 2015

Cidade dos Anjos


Nenhum dia deixou de existir após o fim do mundo.
Do mundo que era morno, e pulsava como um coração jovem;
Destemido, selvagem, louco.

Nenhum dia realmente existiu após o fim do mundo.
Como um fantasma enclausurado, permaneci.
Janelas e portas bem fechadas.

As estrelas não mais ascenderiam o céu.
A canção não seria mais ouvida.
A cidade perdera seus Anjos.

Há esta força impenetrável e misteriosa,
Como diamantes adormecidos,
Jamais descobertos, jamais despertos.

O destino. A pena. A escolha.
Foi vivido o que era de se viver, nada mais.
Então os Anjos não mais se uniram.

E a cidade agora chora todas as noites,
Carente da claridade outrora tão vasta, abundante.
Um pequena cidade ainda ingrata...

Uma pequena cidade de coração em carne viva...
Viva!
Que ao menos hoje, chora mais leve.

Brasas


As memórias permanecem ao alcance das mãos como brasas.
Incapazes de iluminar,
Mas propensas a ferir.
E da mesma forma que a Terra cumpriu sua sina,
Também girei por 365 dias ao redor de algo maior, distante, intocável.
''É inútil!''
Bradam, com razão.
''Não se pode ganhar um jogo perdido...
Não se pode reconstruir um sonho partido!''.

Aprendemos a construir bombas e selvas de pedra;
Aprendemos a decifrar códigos perdidos na imensidão da vida e olhamos curiosos para os cantos sem luz do espaço;
Mas não aprendemos a amar.
Não aprendemos a lidar com a passagem das horas, com as consequências.

Somos crianças... tão jovens.
Carentes de misericórdia e amparo.
Mal compreendemos o que está sobre a nossa pele, que se dirá dos recôncavos da alma!
Somos inocentes.
Inocentes do nosso amor e do nosso ódio.
Inocentes e tolos...
Pois dominaremos as estrelas
antes de aprendermos a dominar nossos corações.

21 de jul. de 2015

Sirenes e sinos


Da torre do santuário próximo, sinos badalam pela manhã.
"É vida que nasce?" Pergunto às meninas.
"Não." Dizem. "Vida é coisa passada.".
Mas ninguém sabia ao certo...
E eu penso que toda vida merece mesmo ser recebida com o badalar de sinos.

Mas pela tarde,
Sirenes cortaram o silêncio frio das ruas pacatas.
"Não é morte!" Pensei. "É resgate!".
No dia em que a esperança faz morada na alma,
Tudo se volta à melhor hipótese.

E meus olhos, ninguém os vê;
Mas enfim voltam a marejar a cada beleza,
Como pelas avenidas, rosadas de tantos ipês agora floridos.
O coração, por um instante, é trégua.
Sem granadas explodindo numa zona de interminável guerra.
Hoje, ele parece este céu: ainda que nublado, emite dócil claridade.

18 de jul. de 2015

O rei foi deposto


Seus fantasmas rastejam por minhas entranhas
Como vermes vorazes.
Soldados famintos, servos de um rei de caos.

Eles me devoram, deixam um rastro de vazio;
Que se junta a outros tantos vazios,
Deixados por tantos outros reis indiferentes.

Mas eles consomem minha alma apodrecida,
A parte maculada e nunca mais bendita.
Pois suas mãos tocaram, suas mãos violentaram.

E eu me tornei um faminto de Luz,
De uma Luz que nunca existiu,
Que não tinha obrigação de existir.

Mas eu a perseguia, a perseguia...
E até a vi, pairando tão doce e distante.
E eu até olhei os campos floridos que margeiam o paraíso.

Olhei nos olhos de anjos e demônios.
E me tornei anjo e me tornei demônio.
Mas livre! Você já não tem poder...

Você foi deposto, você nunca reinará novamente.
Minha vitória, minha derrota, minha luz, minha escuridão
Nada mais devem a você.

Enfim uma natureza livre, errante;
Não mais envergonhada, mas selvagem,
Felina faminta na selva solitária.

O mau rei foi deposto.
Santo ou profano, apenas meu é meu espírito.
Seus vermes não têm mais do que se alimentarem.

Andamento



Alguém está tentando nos consumir outra vez.
Silenciar a voz dos nossos salvadores.
São tão fortes assim,
Seriam eles tão fortes assim?

Capazes de consumir as migalhas da nossa esperança,
Como pássaros famintos e indiferentes e enlouquecidos.
É humana minha carne,
É humano meu espírito...

...que santidade esperaram de nós?
Que santidade esperamos deles?
Todos crianças, nós;
Desabrigadas, desesperadas por um lar.

Mas tantas, tantas portas trancadas.
Minhas batidas nas madeiras frias já são leves.
Sei que inaudíveis, sei que ignoradas.
E eu volto, volto ao velho e silencioso Jardim.

O Jardim que cresce sem a necessidade de milagres.
O Jardim onde nem o Amor nem os Pesadelos residem.
Apenas um pedaço de Terra onde descanso minhas mãos,
Apenas uma trégua ao coração fatigado.

17 de jul. de 2015

Ai!


A nossa carne em suas pedras,
Nossos pés nos seus espinhos,
Nosso sangue em seus cálices de ouro.

E não temos direito aos "ais!"?
Não temos coração em chamas?
Não temos almas em farrapos?

É vergonhosa a lágrima pura
Sincera e humana.
Quente como o Amor que um dia senti?

Não posso?
Não devo?
Não é de bom tom ainda sentir?

Sentir a noite e sua generosa suavidade;
Sentir o corpo em fúria dentro de outro corpo;
Sentir o medo da inevitável partida de tudo, de todos?

Clemência, rogo.
Ao menos a minha dor, tão minha:
Não a faça sentir vergonha.

Jaz todo resto, frágil, passageio, efêmero.
Deixa-me a minha dor menina, tão boazinha,
Aqui acolhida, num âmago já esquecido.

Mas manhã começa outro dia.
E nasce sol, esperança, desabrocha flor.
Amanhã, eu começo de novo.

Livros em promoção!


A poesia sempre foi a materialização dos sentimentos e sensações extraídos do meu mundo externo e interno. É o transbordar. Aquilo que não cabe mais apenas dentro da alma torna-se sentimento em palavra.

"EM MEU JARDIM SECRETO..." (2010) foi meu primeiro trabalho. Nas prosas-poéticas do livro, o eu-lírico é um Jardineiro, cultivador de si mesmo. Um Jardineiro descobridor de terras férteis e terras estéreis dentro da própria alma.

"ALMA À TONA" (2012) é a emersão, o amadurecimento. É o olhar de frente para si e para o mundo, extraindo desses fatos e ralações a poesia que em tudo reside.

"MAIS DE MIL PALAVRAS - A POESIA DA IMAGEM" (2012) figura-se na necessidade de dar cor e forma aos sentimentos. É um livro poético-fotográfico.

"NUVENS DE JANEIRO" (2013) é a expressão metafórica da força e da suavidade. Nuvens são calmas, brancas, pacíficas; ou ameaçadoras, perigosas, destruidoras. As poesias desse livro trazem essa leveza e esse peso de sentimentos.

"CHIAROSCURO" (2014) é ao mesmo tempo uma coletânea e uma ode ao amor.
Ao passar dos anos notei como a escrita ganhou corpo e personalidades mais consistente. A vida, esse misto de dor e prazer, luz e escuridão, é retratada nessas páginas sob a perspectiva da dualidade que a mesma apresenta em todas suas peculiaridades. "Chiaroscuro" traz os poemas que julgo mais relevantes das obras "Alma à tona", "Mais de mil palavras" e "Nuvens de Janeiro", além de dezenas de novos poemas. Este trabalho deve ser visto como um retrato, um quadro, uma imagem, regada a claridades e escuridões.

"EX-VOTO" (2014) foi o livro de poemas que escrevi com a maior intensidade que havia na alma. O livro marca a trajetória de um coração que encontra seu sonho maior, o Amor, e dele é obrigado a se despedir. Contudo, não apenas isso. Os poemas emanam a busca pelo divino, pela fé e os mistérios que a vida nos faz suportar a todo momento. Todo ex-voto é uma prova de superação, uma prova de que a pior fase da Dor passou. 

"TEMPOS INVERSOS" (2015) é o caminho que se segue após a Grande Dor de "Ex-voto", é o sobreviver após o "apocalipse", encontrar o que ainda resta de divino nos escombros de uma realidade seca e não alentadora; porém, aquilo que é a cerne da alma continua vivo, pulsante: O Amor ainda é a seiva que nutre seu âmago, e seu âmago resiste. Muitos poemas são áridos, como o inverno, mas esperançosos de uma nova primavera. O Tempo já não faz sentido, nem impõe suas regras; passado muito ou pouco dele, tudo é medido pela intensidade das emoções.

Aos que desejam um mergulho, ou melhor, uma emersão no universo da poesia e do sentimento, fica aqui meu convite: http://migre.me/qNZb2

15 de jul. de 2015

Antes do mundo acabar



E os dias escurecidos,
Sem um brilho não mais como aquele antigo
Apontam que algo muito valioso e belo,
Delicado e gentil,
Foi atirado ao chão e ali permanece destroçado.

Os bárbaros estão vindo...
É o fim da infância, meu inexistente amor.
Eles querem nos silenciar,
Eles querem que tenhamos medo.
Mas eu ouvirei mais uma canção antes do mundo acabar.

Que eu morra de mãos estendidas,
E que nelas seja visto que um dia tocaram o Sonho.
Não o Sonho que parte, não o Sonho que desiste,
Mas o que queima vivo como lava
Dentro de um peito cada vez mais endurecido.

Ainda estão lá aquelas velhas estrelas,
Aquelas velhas ilusões...
Seriam mesmo uma mentira?
Seria mesmo tudo uma mentira?
Mas eu vi, eu vi uma estrela ascender.

Eu vi um pedaço de arco-íris
Numa manhã de sábado sem chuva;
E por um instante acreditei em bons presságios.
Eu vi uma delicada rosa esconder
O brilho orgulhoso do sol.

Por um ano bebi da indiferença,
Como se não a tivesse bebido também em todos os anteriores.
Talvez seja o fim do mundo, meu inexistente amor,
Mas eu ouvirei mais uma vez aquela bela canção,
E de alguma forma, a canção não mais findará.

12 de jul. de 2015

"Paciência"


São tempos loucos, meu bem.
Os amantes estão dispersos
E os odiadores, todos juntos.
Onde estamos errando?
O que não vemos bem diante de nós,
Como nosso próprio nariz?

Sempre houve essa dor primordial,
Que ninguém vê, toca, alcança;
Pela qual ninguém chorou.
Talvez, alguém...
Um dia, numa praça,
Num banco de ladrilho azul.

Já não busco expor o sentido,
A graça, a beleza, a ventura.
Nem o pranto que cai quando partem,
Quando retorno, quando desmorono,
Quando mais uma vez,
A vida prova ser instantes.

"Paciência, paciência, paciência.".
Repetia dócil senhora...
É disso que vamos vivendo:
De paciência ou de revolta.
Ou das duas coisas;
Elas fabricam o amor.

10 de jul. de 2015

Sem me alcançar


Mostra tua face, demônio covarde!
Que prazer sórdido te consome
Ao enegrecer meu sonhos,
Esta minha parte ainda pura e menina?

Mostra tua face e avança. Vem,
Que não fugirei feito felino assustado,
Que não me terá em tuas mãos podres,
Que não te entregarei a lágrima que é apenas para o amor.

Para o amor que já existiu e também como eu
Fugiu.
O que será que tem de doce minha esperança,
Para sorve-la assim com tanta ânsia?

Mostra tua face, demônio amigo!
Que perdoo tua inveja, perdoo tua solidão.
Já não me persiga na madrugada congelada,
Mas caminha ao lado deste que também nada tem de santo.

É também triste meu rosto, é também oculto por sombras.
Também persigo sem jamais alcançar sonhos pairando distantes.
E o que há em você, talvez também seja o que restou em mim
Depois que todas as luzes partiram.

9 de jul. de 2015

Eu e o lugar


Mais dos versos a ninguém...
Mas eu lembro: estes olhos já se encantaram,
Este corpo já foi mais poesia que carne.

Pedi trégua. A quem?
Tentei acreditar que alguém tinha as rédeas de peito,
E guiava muito mal.

Ah, eu já voei por essas ruas e labirintos...
Já pensei ter um lar, antes de sentir que lares
Não são lugares, são pessoas.

Ouço o chamado quase mudo de sentimentos mortos.
Sentimentos longínquos... facilmente substituídos.
E lembro que por uma vez eu parti.

Parti das velhas ruas, de mesmos perfumes e pessoas,
Onde já nas noites de paz, tão raras, não flutuo mais.
Parti em busca do lar, o lar tão morno e gentil...

Mas que estava de portas trancadas.
Bati nas janelas, chamei pelos vizinhos, fiz drama no portão.
Silêncio.

Voltei para o velho lugar, mais sujos, mais densos, mais feios,
Eu e o lugar.
E passei pelas velhas ruas, desviando de memórias em decomposição.

Todo dia ainda é um adeus, entende?
Um adeus a tanta, tanta coisa...
Adeus.


Sete bilhões de universos


Nada menos que um nervo pulsando, exposto.
Não como todos, protegidos por duros ossos,
Por claros objetivos; mas apaixonado por nuvens passageiras.
Chorando à brisa que o acaricia com sua voz de menina.

E já não importa que alguém entenda, que alguém sinta.
Pois se até o amor se despediu tão facilmente... o que resta?
Ele pegou a estrada e nunca mais voltou,
E está bem nas ruas frias da cidade suja.

Não é preciso mais fazer qualquer um
Sentir qualquer coisa.
Estamos todos desconectados.
Sete bilhões de universos opostos num planeta mesquinho.

Nada mais que um nervo pulsando, externo.
Na chuva, no sol, na súplica,
Meu pequeno príncipe...
Escravo de suas quimeras famintas.

Mas a poesia vai continuar,
Ainda que não sirva a nada depositar nos escombros
De um mundo louco,
Sementes de flores de pouco perfume.

Aqui, da terra dos lunáticos e amantes,
Também podemos ver tudo pulsando errado.
Alguns se escondem atrás de grades e indiferença,
Outros, atrás de versos.