27 de jun. de 2021

27/06/2021


 O fluir do tempo foi trazendo essas rachaduras pelas paredes, pelo chão, pelo peito. E ao contrário do que disse a poetiza, não sinto que é por elas que a luz entra.

Apenas permanecem ali aqueles pequenos vãos que eu não sei se são inofensivos ou se são sinais de algum perigo. Mas tento não temer.

E quando sozinho pelas ruas ainda inebriadas por vazio e calmaria, eu consigo não notar o tempo por instantes. Mesmo sendo aqueles caminhos tão ancestrais e tão meus, nada de memórias, nada de sonho ou de saudade. Então agradeço pelas nuances de trégua

E foi por isso o primeiro verso e será por isso o último talvez, e tudo o que houver entre eles: uma tentativa fugaz de não deixar partir o querido menino. 

Não o menino transpassado por ânsias vis, mas o menino que corria de pés nus pela areia esbranquiçada com as flores do canavial nas mãos brilhando ao pôr do sol, antes da noite devorar toda a claridade e deixar apenas um assovio incômodo em seu lugar.

Ainda há nos fundos da alma um velho jardim que abriga em suas terras tudo o que foi amado. O jardim que pede por cuidado e alento, onde com ferramentas danificadas ainda perfuro o solo que esconde grandes pedras de medos e remorsos, e insisto a semear sentimentos doces e simples, insisto, insisto... Regando-os em seguida com aquela mesma antiga luminosidade do poente da infância, e algumas rasas lágrimas de fé.