15 de nov. de 2014

Pelas lágrimas


Pergunta-me displicente a razão:
"Por que as flores?
Por que estes dedos sujos e feridos de cavar a terra seca e desnutrida?
Qual serventia tem esta beleza para ninguém?"

'Para as borboletas' - Digo.
'Quem sabe, beija-flores'.
Gargalha espalhafatosa a razão.
"Só por isso?!" - Desdenha.

"Eu vi quando os olhos que mais amou ignoraram sua primeira rosa.
Eu vi quando a estiagem veio, e você gemia e soluçava sob o sol.
Eu vi quando sua fé partiu, frágil como as roxas flores despedaçadas.
Eu vi. Apenas eu vi." - Diz, fria.

Mas eu digo:
'Então viu pouco, cara senhora.
Não viu o ipê amarelo ganhar altura e força.
Não viu que a roseira ignorada novas flores desabrochou.

Não viu, amarga senhora, 
as folhas esverdearem novamente após a dura seca.
E não sabe, mas quando borboletas, mesmo as de simples beleza,
roubam uma gotícula de néctar das jovens flores, lágrimas me jorram.

Lágrimas tão leves, insignificantes, doces...
Lágrimas já tão raras, agora que o coração começa a endurecer.
Lágrimas tão minhas, que não podem ser usurpadas.
O Jardim é por elas. É por essas lágrimas.'