24 de ago. de 2011

Paradoxo*


O Amor é mesmo um fogo que arde sem se ver; uma sarça ardendo sem se consumir. A voz de mil anjos aos ouvidos, queimando-lhe os tímpanos, transformando cada pensamento enraizado em pluma leve, e cada pluma leve em fortaleza firme. E a pele, a pele macia e suave, exala labaredas.
O Amor é mesmo uma ferida que dói e não se sente; esse peito aberto por onde entram brisas e temporais, esperanças dantescas e medos mesquinhos. Um alívio grande em ser cortado pela saudade desumana. Percorrer em segundos aquele caminho infinito.
O Amor é mesmo um contentamento descontente; um tráfego por paraísos que inibem e assustam de tão belos. Paraísos que metem medo de tão intensos e completos.
O Amor é mesmo dor que desatina sem doer; é receber dentro de um coração pequeno um milagre imenso, ver suas paredes esticando, rasgando, rompendo-se... enquanto dos olhos jorram lágrimas de mais pura felicidade.

O Amor é mesmo um não querer mais que bem querer; essa vontade de correr para bem longe, se for para poder vê-lo se aproximando mais e mais... com o sol dourando-lhe os cabelos, o sorriso reluzindo no rosto.
O Amor é mesmo um caminhar solitário por entre a gente; pois que tudo e qualquer coisa além dele próprio é pouco ou nada. Nenhum olhar, nenhuma voz, nenhum perfume, nenhum caminhar... nada se compara ao seu olhar, à sua voz, ao seu perfume, ao seu caminhar. Tudo além de ti é apenas ausência.
O Amor é mesmo nunca contentar-se de contente; a divina ambição insaciável. É nada, nunca, ser grande o suficiente se posto ao lado da sua presença. É alcançar o limite de uma alegria ilimitada.
O Amor é mesmo cuidar que se ganha em se perder; oferecer tudo o que as mãos e o espírito alcançam. É deixar partir tudo o que se sentiu, ficar vazio, mas ser preenchido pelo universo, ao mesmo tempo.

O Amor é mesmo querer estar preso por vontade; em braços, pernas e vontades. Um desejo de escravidão, mas que faz alcançar com as pontas dos dedos as chuvas das montanhas, os oceanos esverdeados, os céus azuis; todas aquelas bonitas faces de Deus.
O Amor é  mesmo servir a quem vence, o vencedor; o prazer em abdicar-se, de reconhecer-se ínfimo diante do milagre, é aceitar-se pequeno fazendo o máximo. É reconhecer-se servo com honra, pois serve-se a quem venceu-lhe as sombras, os medos, as dúvidas.
O Amor é mesmo ter com quem nos mata, lealdade;
pois é simples, morre-se desse Amor, e ainda assim, continua-se a viver dele.


*Construído sobre o soneto de Luíz Vas de Camões.