5 de jul. de 2011

Dos milagres


Havia um milagre nessa tarde.
Quem o viu?
Diga-me por favor!
Quem entre todos poupou um segundo de vida a favor dele?
Havia um milagre no fim dessa tarde...

Era o sol, se pondo em forma de uma fogueira ancestral, tingindo de ouro as neblinas remanescentes da manha fria. Manhã fria que gotejou perfumes, bênçãos em forma de florinhas.
Fez-se o céu um manto de fogo suave; 
vermelhas, laranjadas, púrpuras... dançavam as nuvens por entre os prédios, árvores secas e catedrais.
E parecia ser apenas eu ali, perdido com passos lentos e desconexos, ouvindo canções tristes e olhando para o céu pintado, milímetro a milímetro, por Deus.
Todos estavam tão ocupados para a vida... estavam presos em suas empresas, presos em seus lares, presos em seus desejos imensos, consumindo felicidades sintéticas, enlatadas, sem tempo para a beleza real que gritava alucinadamente bem acima de suas cabeças.

Eu só queria ficar ali, perdido naquela claridade macia e infinita, 
acreditando que tudo de mais importante já estava diante de minhas mãos.
Eu não queria mais sair em batalhas, eu queria adormecer naquele instante, e estender... estender o momento até o sempre.
Eu quis mergulhar naquela luz, e rir junto dos serafins que fabricam as nuvens fofas.
Depois, fazer-me gota reluzente e me fixar no manto negro como pequena estrela calada.

Pena tão logo as claridades terem cessado... 
a noite chegara tão escura e silenciosa.
O céu, antes bordado em ouro, rende-se a um escuro abissal.
E faz frio; e você, distante.
Pena eu não ser detentor de poderes grandes, capazes de perpetuar algumas intensidades.
Pena haverem finais felizes, pois são finais.

Porém, quem sabe amanhã haja outro sol!
Ainda maior, ainda mais belo, ainda mais sorridente!
Quem sabe amanhã, estejamos separados por apenas mais um dia...
E não por todos os fantasmas que alimentei em minha alma.
Quem sabe amanhã eu acorde com tua face diante do meu olhar outra vez,
e isso seja capaz de me ressuscitar para um novo dia, uma nova vida, uma nova estrada.