24 de mai. de 2020

25/05/2020


O passar rastejante do tempo foi tirando o direto à dor, ao lamento.
Sem importar quão vivas fossem as memórias ou as saudades, tudo deveria repousar em um leito frio, onde a luz não chega.
O passar do tempo foi tomando o direito ao sentir.
Tantas novas batalhas a se perder no porvir, que mais nenhuma lágrima está disponível à longínqua grande derrota.
E todas essas palavras... batidas, gastas, surradas, cansadas. As palavras foram friamente e maquinalmente extirpadas dos meus dedos, dos meus lábios. Porque a poesia se viu farta de carregar sozinha por anos à fio um espírito alquebrado, um coração que não conhecerá a cura.
A jornada é esta noite fria que desliza sorrateiramente, movendo as peças de lugar, colocando suas vítimas em lugares perigosos, instigando-os a passos desconcertados e imprudentes.
É então que uma claridade débil cintila nos meus olhos, e eles lançam pra dentro da mente uma espécie de oração que confunde imagens e vocábulos, refletidos em si mesmos, ondulando como folhas secas no vento, confundindo futuro, passado e presente, tornando-os uma coisa só, e coisa alguma... uma perda, um vão, um caos calado.
E desperto, mas é dentro do mesmo sonho ruim, e minhas mãos nunca alcançam a luz, nunca alcançam. E a questão não é onde, mas quando estou. E é quando é dito o adeus, é quando a calmaria é farta de uma ironia que sussurra ameaças.
Então eu sei sem que os anjos me digam que meus pecados não são meus erros, meus danos, meus apelos; meu pecado é a covardia. A covardia de esticar os braços infantilmente em direção ao alvorecer que não se fará. Minha covardia de desviar o olhar da imutável engrenagem dos dias que a tudo, a tudo consome.