Antes do sítio do Velho Tonho, tinha a Floresta Proibida das
Lebres Cinzentas. Eu mesmo dei o nome, mesmo que ninguém nunca saiba dele.
Contava minha mãe que lá existiam canibais, formigas gigantes, cobras com
dentes de morder e hienas risonhas e famintas. Eu era meio esperto, só
acreditava nas formigas gigantes e nas cobras, que não deviam ter dentes coisa
nenhuma.
Mas nunca ousávamos entrar. Ficávamos só nos arredores, que
tinha imensas árvores de caule branco de onde pendiam cipós grossos em que
balançávamos a tarde toda.
Raras vezes ousávamos dar uns passos adentro, com cuidado,
ouvindo os pássaros e vendo as lebres correrem para longe, como loucas.
Tínhamos medo do que as assustava, sem saber que o que as assustava éramos nós.
Pra mim, era também um lugar sagrado, ainda intocado, onde
fadas e magos podiam viver em paz, fazendo as flores crescerem e desabrochar. Que
pena nunca ter encontrado com algum deles. Eu teria ficado fascinado!
Mas eu sei que estavam lá, criaturinhas do bem, espreitando e
protegendo aquele santuário para que ali não entrassem maus espíritos.
Agora resta na memória apenas o perfume daquele lugar mágico,
aquele lugar tão meu. Que talvez não exista mais no mundo real, porque o homem
ainda pensa que precisa destruir o Belo para ficar rico; ainda pensa que
precisa ficar rico. Mas em minha mente ele reside, intacto, cheio de lebres
cinzentas velozes e cipós de balançar.
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