15 de abr. de 2024
5 de abr. de 2024
Alvorada
O que é Vida senão um quase eterno processo de renascimento?
A flor dá lugar ao fruto, que dá lugar à semente, que dá lugar a uma nova planta.
Ciclos se iniciam e se encerram, modificando intimamente os personagens que fazem parte desses processos.
O próprio planeta passara e ainda passa por uma era de profundas transformações, algumas severas e gigantescas, outras delicadas e até belas.
A poesia surge em meio a toda essa dinâmica com a liberdade de levar muitas vezes sentido e consolo, uma forma sutil de reflexão para se compreender o que se vive, o que se viveu e o que é sonhado; talvez mais que compreender: encontrar o sentido sagrado que permeia todas as coisas.
Este trabalho tem então o humilde desejo de registrar os sentimentos provindos dessas tantas nuances experienciadas, mas acima de tudo, é um registro de um momento de esperança, da Luz tomando lugar das sombras, da claridade lentamente voltando a reinar após uma longa noite escura.
"Alvorada", minha décima quinta aventura com a palavra, estará disponível no Clube de Autores em 16/04.
16 de mar. de 2024
Cinzas
Infinitas palavras desde então
Sem começo, sem fim
Eternas
Construindo-se metaforicamente sobre si mesmas
Torres imensas
Como árvores gigantescas
Mortas
Esparramadas em um deserto onde nada mais floresce
E essas singulares miragens entoam canções confusas
Ora sobre o que se passou
Ora sobre que se sonhou ser
Ora sobre o que se perdeu para sempre
Você então cruza o céu como uma deslumbrante ave em chamas
Alto, muito alto
Inalcançável, já que é apenas uma memória
Que se apaga, e morre
E renasce das cinzas que sempre guardo
E sempre guardarei
Até que se perde no horizonte em que brilha uma alvorada petrificada
Que nunca ilumina por completo
E eu já não choro
Eu já não clamo
Já não espero
Pois que o vento sopra e para longe me esparrama
Feito que memórias em cinzas me tornei também.
Há uma tempestade
Há uma tempestade nem sempre bela em seu coração
E suas águas que nutrem os jasmins
Também levam do solo as flores mais frágeis
As promessas recém plantadas.
Há uma tempestade ainda em seu coração
E seus vendavais destroçam os vitrais
Assustam os anjos
Avançam cômodos adentro.
Há uma tempestade... em seu coração
Mas os relâmpagos insistentes clareiam pequenas joias pelo chão
Apontam o caminho pelo escuro
Te impelem a uma oração.
Há uma tempestade... que é seu coração
Que como o filho pródigo olha para trás
Olha para o caminho adornado de erros
Clamando um sorriso, um beijo de absolvição.
11 de fev. de 2024
Em Teu caminho
Em alguns dias, Mestre, correrei em Tua direção;
Feliz, confiante, de braços abertos,
Sorrindo e cantando.
Em alguns dias, Mestre, caminharei em Tua direção;
Resignado, sóbrio, firme em meus passos,
Emocionado por ver-Te em meu horizonte.
Em alguns dias, Mestre, engatinharei em Tua direção,
Feito uma criança frágil, titubeante, temerosa;
Embora convicto, plenamente, de estar em Teu caminho.
Em alguns dias... Mestre, estarei sem forças, cansado, com mãos e pés feridos;
Então, Mestre, eu rastejarei em Tua direção,
Lentamente, com olhar envergonhado por minha fraqueza,
E não haverá em mim nada de Belo, além da pequena Luz do meu coração apontando o caminho...
E nestes dias, principalmente neles, saberei: qualquer que seja a velocidade, jamais deixarei de ir em Tua direção,
Pois és meu Caminho,
És minha Verdade,
És minha Vida.
Rogava pela luz, e a luz aos poucos se fez
Às vozes todas, às gargalhadas
Uma resposta silenciosa
Os ombros em riste
Não o medo
Não desta vez
É passado o tempo das sombras
E a alvorada arrebentará o horizonte em luzes magnânimas
Fará-se o novo tempo acima do velho
Fará-se boa nova pelos abismos do espírito
E se impossível o voo
Que haja o caminhar
Se impossível o caminhar
Que rasteje-se caminho afrente
Mas seguindo, seguindo
Sem desvios, sem atalhos, sem dúvidas
Até que se bata na sagrada porta
E ela se abra
Deixando transparecer o primeiro dos novos dias.
24 de jan. de 2024
Prelúdio
Quando alguma noite de janeiro consegue ser amena
O céu canta uma melodia ancestral
Quase um lamento repleto de saudade
E também de esperança
O vento traz um aroma de mirra
E as nuvens repousam calmas e tem a cor de um âmbar pálido
E é como se a noite se rendesse junto a mim
Dobrasse seus joelhos em uma oração como as da infância
Quando tudo era repleto de uma mágica beleza
Sei que estou retornando...
Sei que são passos simplórios em direção ao que de valioso se perdeu
Sei que chegará a alvorada em que outra voz se unirá à minha
E luzes e canções se farão então por todos os cômodos da alma
Ainda não é chegado o tempo
Muitas pedras a remover
Muitas roseiras a plantar
Mas há por enquanto esta noite
Um prelúdio do que seria a vida
Se fosse um poema.
21 de jan. de 2024
Uma após outra
Ainda a remover pedras, uma após outra
Sempre, sem cessar
Enquanto remove, renasce, purifica
Com uma canção sempre a tocar
Certas ilusões não lhe vestem mais
Refaz teu reflexo, teu caminho
E leve, enfim, sobrevoa os pecados deixados lentamente para trás
Do alto, verá o que cresce e refloresce
Sozinho, simples, completo
Teus anjos não repousam longe, mas flutuam contigo
Em teu peito, uma chama ressuscita
Pequena, morna, bonita
Do alto, alguém cuida de ti, sonha contigo
Acolhe tuas orações com carinho
Sem reinícios simbólicos desta vez
A vida caminha para seu cume
E quando lá chegar
Que veja paisagem deslumbrante, silenciosa, iluminada
E quando de lá partir que seja outro
Melhor
Seja verdadeiramente
Quem de fato é.
Desavisados
Em algum momento é irresistível desejar ser novamente criança e ter a mãe a dizer vai daqui para ali, ou faço isso ou faça aquilo
Sem que tenhamos que pensar muito pois que alguém havera pensado antes com muita precisão e sabedoria
Para tudo se há horas e organizações
Para tudo há muita segurança
E ainda que muito falte, nada falta
E ainda que muito doa, nada dói
Então crescemos desavisados de que precisamos crescer
E começa-se a pensar na vida, na morte, nas consequências todas
E há tantos números a serem calculados, tantas portas a serem trancadas, tantas janelas a serem fechadas que quase já não vemos mais o céu, não vemos mais a imensidão
Crescemos e tudo se torna diminuto, razoável, necessário
E mesmo comentando pequeno atos de rebeldia, como manter as luzes de natal por todo o ano, deitar no chão para olhar as nuvens, escrever poemas bobos
Temos medo...
Medo de que não sejamos mais nem uma memória para aquilo que já amamos
Medo dos despertadores que só esperam a hora certa para nos banhar em realidade fria
Medo do tempo...
Que não existe, e ainda assim, troca de lugar todas as coisas... algumas, para sempre.
11 de jan. de 2024
O tempo
Há essa voz em minha mente que sempre se repete:
'O tempo é um animal tão mutante!'
Uma hora se é menino, noutra se tem o coração partido.
E a gente passa meia existência perdendo pedaços,
Pequenos caquinhos que vão caindo pelo caminho,
E passa outra metade voltando e recolhendo essas partes, tentando formar uma alma completa, curada.
E então a vida salta espalhafatosa, gira uma dezena de vezes e cai de pé esperando aplausos,
E o aplauso não vem.
Alguns olhares são de soslaio, insípidos,
Todo mundo esperando aplauso também.
Mas o tempo, sim, o tempo.
O tempo na verdade não existe...
Tudo começou com um homem inventando um relógio
E outros homens comprando esses relógios até a coisa sair do controle
Mas o tempo mesmo, não existe,
É uma abstração feita para definir outras abstrações,
Como as saudades, as pessoas, os sonhos.
A gente coloca tudo dentro de um cronômetro e o quanto ela viver ali, mostra sua importância.
E nem tudo obedece à regra...
Tem coisa que foge pelas frestas e permanece,
Quietinha ao nosso lado,
Durando para sempre;
Tem coisa que não importa o quanto dure, dura pouco demais;
Tem coisa que ainda bem chegou,
E sempre esteve aqui.
8 de jan. de 2024
Foi há dez anos
Foi há dez anos
Foi ontem
E só na memória restam provas de tais épocas
Profundas...
Como um oceano misterioso
Onde repousam tesouros para sempre perdidos.
Em algumas tardes o céu se pinta do mesmo azul que habitava em seu olhar
E há então um sopro morno e mágico de saudade
Nada foi tão puro desde então
E nada será
Pois por vezes eu volto de longas peregrinações até esse santuário
E ainda repousa imóvel no altar meu ex-voto
Meu coração de pedras e flores
Inerte, mas tão cheio de vida
E eu tiro minhas sandálias pois adentro em solo sagrado
Tiro minhas roupas pois já não causam vergonha as cicatrizes
Tiro as máscaras que camuflam meus pecados...
E o que resta, se não é belo,
Ao menos tem um brilho verdadeiro.
Olho com doçura para essas paredes, para meu reflexo nos espelhos, para o sentimento materializado diante de mim
Uma brisa fresca sopra pelas janelas,
Um ipê flori lá fora, uma rosa desabrocha, uma borboleta salta pelo ar
E eu começo a enteder, década depois, porque nunca parti por completo
Aquele sentimento que já não pode mais possuir um nome
Trouxe à tona a mais bela parte de mim.