31 de jul. de 2021

31/07/2021




 Velhos versos em páginas manchadas pela beleza de um tempo em que sonhos juvenis transitavam sem medo por calçadas, ruas e rodovias. 

"Há teu cheiro no cheiro da noite que apenas eu sinto."

Eu dizia...

"No canto triste do pássaro enjaulado, há o meu canto: preso distante de ti.

A lua brilha, cheia, como a safira feliz dos teus olhos."

E já não me lembro sequer pela luz de quais olhos eu lamentava a ausência...

"Amo a noite como se te amasse.

Deixo os braços negros dela me tomarem.

Observo-a como você me observa: de lábios selados, olhar atento.

Sem palavras." 

E eu sorrio ao sentir na boca um gosto sutil da pureza daqueles antigos anos dos quais apenas rabiscos em letra torta sobraram. 

Em outras linhas eu digo como que a um reflexo: tudo o que fui prossegue em mim. 

E as palavras gentis do eu passado não servem de grande consolo diante dos ventos frios que sopram pelas frestas saudades amorfas,

Mas elas, depois do tanto que já partiu, permanecem aqui,

E estarão comigo quando estas mãos frias se levantarem novamente em um brinde à vida,

Estarão quando, se talvez, um dia, um novo verso de amor puder ser traçado,

Estarão aqui quando os sorrisos forem novamente permitidos e novas receitas para futuras saudades puderem ser escritas.

28 de jul. de 2021

28/07/2021

 


O sopro gélido parece ser o que sobra do movimento das asas dos anjos quando os sinto partindo mais uma vez. 

E eu atiro versos cansados, fracos, para alimentar a pequena chama que resiste a aquecer os cantos do espírito onde a luz quase não chega. 

Uma chama que já quase não aquece, mas que não posso deixar morrer.

E não é muito, mas o fogo frágil ainda exala um perfume de mirra e jabuticabeira em flor. 

Enquanto isso eu falava das coisas sagradas brotando sobre as rudes e frias montanhas da realidade que todos carregamos, 

Eu falava de algo de belo mesmo nas tardes cinzentas e quase sem vida.

Eu falava, falava...

Tanto.

Toneladas de desejos, lamúrias, desistências, memórias, desaguando em um infinito de esquecimento. 

E menos sozinho talvez estivesse se fosse aquele menino esquecido na terra estrangeira dos devaneios, porque havia um sorriso que me permitia sorrir também...

Lá, por onde eu seguia em caminhos pavimentados de utopias, eu podia sonhar com um pouco da claridade solar aquecendo ainda mais as mãos entrelaçadas,

Acreditando por um momento que talvez,

Na verdade, 

O sopro gélido esteja vindo do bater de asas dos anjos que se aproximam.

24 de jul. de 2021

24/07/2021



 Os doces antigos anos flutuam como lembranças quase esquecidas em uma atmosfera distante, inatingível, feito fossem pequenos vagalumes dissolvendo ínfimas porções da escuridão das longas madrugadas. 

Foram muitos dias de sol, vento e chuva castigando a fortaleza ebúrnea da inocência;

Muitas palavras, muitas mãos, muitos lábios...

E os poderes mágicos foram se tornando cada vez mais rarefeitos, o mundo foi se tornando mais cruel e a claridade do dia desaparecendo mais rápido. 

E chegam as noites onde a cidade cessa seus murmúrios e cantigas;

Noites frias, de céu profundo e limpo, com o luar leitoso de julho escorrendo suas luzes pelos muros e jardins. 

Então é agosto que se aproxima, penetrando por portas, poros e janelas com um perfume igual ao dos tempos dos pés descalços pela areia morna dos caminhos arborizados. E os olhos marejam um pouco pelas borboletas delicadas sobre as flores singelas que resistem ao inverno, por uma solitária canção que alguém dedilha não muito longe, pelo coração que já não é tão belo agora que com suas cicatrizes, mas que nem por isso se tornou frio 

Ou menor. 

23 de jul. de 2021

23/07/2021



 Três anos para uma década de adeus. 

Tudo já se foi, esvaiu, escorreu ladeiras abaixo junto ao silêncio para mergulhar em uma escuridão indecifrável. 

Em raros momentos, aqueles tempos sublimam-se, liquefazem-se, e chovem sobre a terra castigada. Uma rega rápida, vã, sobre o jardim sedento. 

Éramos tão outros, certa vez me disse no momento de mais uma despedida. Porque eu fui dividindo a ruptura, o abandono, a saudade que havia, em pequenos estilhaços menos cortantes e fui enterrando aos pés das flores para não ver. E já não vejo, só meus dedos cortados sabem que estão lá, para sempre talvez.

E tudo isso é porque você às vezes encontra um caminho para os meus sonhos e sem que eu abra a porta você volta para dentro, como uma assombração que não precisa de chaves. 

Mas eu não temo... As velhas ruínas são castelinhos de areia desfeitos por ondas agora calmas diante dos novos escombros, e já ninguém pode se dar ao luxo de sofrer por dores bonitas. 

Os olhos não secam, os estômagos rugem, o medo cavalga livre pelas ruas que não podem mais ficar vazias, a mentira ainda vence quase absoluta.

E você aqui por um fragmento de instante ou de loucura... ainda maior, com mais luz e beleza, como se a casa ainda fosse sua, como se os lençóis baratos ainda pudessem receber seu corpo. 

E quando a claridade da manhã enfim penetra afugentando os outros fantasmas, esses sim reais, sua imagem vai desbotando junto ao vazio e deixando apenas este pequeno e tolo elo. 

"Éramos tão outros", você dizia...

E eu só pude concordar, escondendo que ainda sou o mesmo, só que sem aquela bonita capacidade de voar.

19 de jul. de 2021

19/07/2021

 


O excesso de silêncio tem deixado uma cicatriz que não se cala. 

Um ruído ininterrupto que soa como um efeito colateral de tanta distância e temor.

E essas avenidas vazias por onde só o vento seco e frio caminha, são tão diferentes das vias internas de trânsito infernal por onde os pensamentos circulam sem lei e sem controle, causando pequenos estragos, pequenas fraturas. 

É estranho tudo isso que restou depois de todos os perdões terem sido oferecidos, depois que os sonhos adormeceram e as memórias tombaram exaustas. 

É um fim de batalha que não oferece paz, não traz calmaria. 

Mas é um fim.

Outros versos sem grande sentido virão em louvor às ventanias do agosto que de novo se aproxima. 

E tudo será dito mais uma vez, e será esquecido mais uma vez, em um incompreensível e sagrado ciclo de angústia e êxtase, de culpa e absolvição.

Porque é certo que a missão do tempo é rejuvenescer a alma, substituindo nocivas ilusões por construções de beleza singela, mas de alicerce firme. 

Por hoje, o sol já se deita suavemente dando lugar ao sopro gélido e escuro da noite, e eu volto a caminhar junto ao vento pelas vielas esquecidas, fugindo em busca da quietude que não existe pelas ruas do espírito.

15 de jul. de 2021

15/07/2021

 


Não é possível saber se vale de alguma coisa cultivar essas flores ingênuas nas brechas pelas quais as assombrações tentam se libertar,

Não é possível saber se as orações simples da infância podem mante-las calmas e afastadas por muito tempo,

Não é possível saber se na verdade isso que ouço arranhar as paredes cansadas da alma são mesmo antigos fantasmas ou meras consequências...

Então se por um instante me for permitido não pensar, eu gostaria de ser como os poetas

Que nunca morrem e nunca sofrem por nada além do amor e da estiagem.

Se me for permitido por um instante não sentir, eu gostaria de ser como o vento que o tempo não consegue ferir,

Ser como os zéfiros que rodopiam as folhagens amareladas pelos caminhos despovoados, anunciando outro enigmático agosto em que há tanto para sucumbir e tanto para renascer. 

E o que vem ao meu socorro é um raro e precioso silêncio sem saudade ou sonho.

Assim, volto a ferir as mãos na terra rude e aconchego frágeis belezas em seu âmago;

Ajoelho-me humilde,

Feito o menino que era livre da culpa,

E agradeço pelo coração que aos poucos conhece a cura,

O coração que aos poucos refloresce.

14 de jul. de 2021

14/07/2021

 


Discretos desesperos são silenciados pela voz macia e rouca não muito distante, 

Logo a imagem de um sorriso oculto,

E um aceno, 

E uma despedida;

E a realidade escorre para fora da pausa e volta a caminhar. 

Pouco há de tudo o que há, 

Já o disse, 

E disse novamente,

E repeti. 

Porque em algum lugar flutua o aroma místico de perfumes raros,

E em algum lugar os pássaros cantam versos misteriosos e sublimes,

E em algum lugar o amor opera maravilhas desconhecidas em almas alquebradas,

Mas aqui apenas reina o mesmo sol de luz descorada

Sobre as cansadas horas, 

Legítimas indignações e

Flores frágeis.

A brisa, os transeuntes, os portões abertos, trazem apenas faíscas de algo embelezado,

Algo que se liquefaz nas mãos mornas da tarde. 

E busco por entre as páginas de bons e maus poetas algo que decifre o murmúrio ininterrupto que ecoa do peito,

Só que não compreendo as palavras que dançam e se misturam arrogantes como se eu não estivesse suplicante ali, 

Como se não precisassem jamais fazer algum sentido aos que clamam seu alento.

Mas sozinho algo eu entendo dos ruídos confusos que me chegam,

Uma melodia com ainda alguma pureza em si,

Que cantarola insistente:

Ainda pulso...

Ainda sou o mesmo,

Ainda estou aqui. 

13 de jul. de 2021

13/07/2021

 


Com as saudades todas gastas, não resta dor adocicada por aqueles dias em que se vagava pelos corredores declamando poesias profundamente sem sentido para amores ainda mais efêmeros.
Contudo, mesmo depois dos tempos das dores dóceis, o córrego raso de versos atravessa a tarde sem ambição, como tanto já fez, refrescando a alma. 
E parecem-me quase santas as pessoas que vagam nas ruas, sem pressa a algum destino confortável,
Parecem-me sagradas as crianças pelas calçadas antes do fim do dia,
Parecem-me dádivas os jardins com roseiras exuberantes nas casas de esquina. 
E é por isso, 
E pelo vento morno que que carrega algum perfume, e pelas vozes confusas não muito longe, e por uma canção antiga e ruim que não para de tocar, 
Que não posso deixar de insistir. 
Benditas essas palavras sem sabor, essas páginas não lidas, não amadas, o coração não disparado, a calmaria não clandestina.
Bendito esse pouco, 
Bendita essa ausência preenchida pelo lume fraco da fé.
A fé que bruxuleia feito a chama de uma vela posta na janela,
Mas que não se apaga, não se apaga. 
Tudo isso, eu sei, é libertação,
O reflexo puro no espelho,
A poesia bonita oculta em mais um poema horrível,
Como uma gema rara presa por entre rochas sem qualquer formosura.
Tudo isso, esse trivial,
Esse quase menos que nada,
É também tanta vida. 

12 de jul. de 2021

12/07/2021

 


"É preciso voltar a crer na força da vida!" dizia ela,

E eu pensava que não era mais possível seguir apenas sobrevivendo à estiagem, 

Às despedidas,

Às memórias,

Aos desencontros. 

Eu pensava que não era mais possível seguir apenas trancando as portas e apagando as luzes,

Observando nostálgico o velho e cansado ipê que um dia floresceu naquele fevereiro tão distante. 

Então percebo que acima do som rude e ruim que o medo entoa, que mais forte que seu cheiro triste e grosseiro,

A alma emite uma canção cheia de acalanto, utopias de tempos bonitos, sonhos pouco ambiciosos, que repousam pacíficos para o porvir. 

E de suas pequenas e delicadas mãos, florinhas de ilusão exalam um aroma adocicado de boa esperança.  

E me emocionou lembrar dos olhares que continuam a se tocar, 

Dos sorrisos ainda ocultos por escudos inevitáveis, 

Mas que permanecem lá, 

Luminosos. 

E me emocionou a voz envolvida em tanta ternura, 

Guiando-me a ver as preciosidades singelas que os versos pobrinhos conseguem por vezes esculpir. 

"É preciso voltar a crer na força da vida!" dizia ela...

E me emociona saber que,

Mesmo sem perceber,

Somos nós essa força. 

11 de jul. de 2021

11/07/2021

 


Sei que já não são os velhos e sagrados faróis a medir as obstinadas e tolas palavras;

O azul que me contempla repleto de um massivo vazio pertence apenas ao céu que precede o sétimo agosto. 

E abaixo do firmamento, uma calmaria suspeita foi se fazendo tão intensa e afiada que lentamente cria pequenos cortes na alma fraca quando esta vasculha outra vez ruas e memórias em busca da própria inocência;

E são dessas fendas que as palavras escorrem.

As palavras, de novo e de novo, elas.

Moldadas por mãos pouco hábeis,

Tomando a forma de preces, de súplicas, de flores, de canções de adeus;

Para em seguida se desmancharem no ar, como as nuvens que o inverno levou embora. 

Mas antes elas me dizem que a vida persiste.

Como os ipês que continuam a colorir os caminhos não muito distantes daqui;

Dizem que, oculto por pequenas flores roxas, 

Resiste o velho e frágil lírio da paz...

Aquele que já embelezou o caminho por onde os sonhos desfilaram.

E tudo, eu sei, é por medo da escuridão e do silêncio, 

Das avenidas continuarem para sempre desertas feito fossem o coração. 

E tudo, eu sei, é por esperança de um outro sorriso, 

Repleto de claridade e absolvição.

9 de jul. de 2021

09/07/2021

 


A poesia resiste para louvar tudo o que é eterno:

As flores novas no jardim sob o sol de inverno,

A canção que ecoa pelos vãos luminosos da alma,

O perfume da memória que o vento traz quando faz curvas sem pensar, 

As crianças que aos poucos voltam a correr pelas ruas de domingo, 

O amor...

O amor que disse adeus e que por isso jamais irá embora.

A poesia insiste por não ser vista. 

Ignorada ela cresce forte e lentamente pelas rachaduras que o tempo vai abrindo pelo chão e pelo coração,

Como as raízes dos belos e bailarinos salgueiros. 

A poesia permanece porque nem tudo precisa de cura ou perdão o tempo todo, só que sendo tantas vezes o único antídoto para todas as coisas, ela escorre docemente pelos trilhos, telhados e ladrilhos, 

Como a chuva santa que se esqueceu desses cantos inóspitos, 

Mas que quando retornar, trará como sempre vida em abundância.

A poesia se despediu junto dos dias ingênuos da infância que a cada estação que se esvai parecem mais um sonho,

E por isso ela nunca, 

Nunca deixará de estar bem aqui. 

7 de jul. de 2021

07/07/2021

 


Adélia e Cora passeiam pelas folhas vermelhas e caídas da tarde;

Não bem elas, 

Seus versos.

Eu suspiro...

"Desejo de beleza", me sussurra...

É sim, Dona Adélia.

É uma fome estranha que não passa, um vazio que não se preenche é nunca. 

A alma insaciável, desiludida,

Vivendo um pouco menos do que gostaria. 

As folhas como fogo despencando pela estação e pela estiagem são alguma coisa... 

Como o amor fora alguma coisa, como o adeus fora alguma coisa, como o medo e a alegria foram alguma coisa. 

E a gente aqui, gente besta, sem muito brilho, tentando ser alguma coisa também. Insistindo.

Sendo isso que parece pouco, mas é até que muito: gente.

Pouco depois da primeira e única estrelinha dourada no caderno de caligrafia pela letra bem feita, veio Cora com seus escritinhos, e eu me lembro que ela lembrava de um bolo pesado e pastoso, e que pra mim foi esse o primeiro gosto que a poesia teve e foi esse o gosto dela pra sempre.

Da mesma forma, a vida... Grossa, densa, pastosa.

E ansiamos, ansiamos, e só comemos também uma fatia tão delgada, tão insossa, antes dela ir pro alto do armário, impossível que só, 

E a gente aqui, crianças molengas querendo mais, mais,

Mas a vida fica lá quase intacta pro café das visitas, 

Fica só pros outros, 

A gente vai e fica e se conforma, fazer-o-quê,

Sem reclamar,

Sem blasfêmia.

E o sol se põe enfeiado, como é difícil de ser,

Contudo, eu sou também o homem de Cecília, 

O pobre com um balde regando o jardim para que não morra por completo de secura. 

Por isso os hibiscos bradam em cores exuberantes, mesmo abaixo de um céu de uma palidez amarronzada feia de dar medo,

Enquanto fico pensando que quem me dera a fé de uma, a força de outra e a doçura da última... Ou ainda, meu Deus, quem me dera esse olhar simples e emocionado,

Que torna mesmo as coisas mais banais,

Coisas santificadas.

4 de jul. de 2021

04/07/2021

 


Embora tudo, pelas imensas avenidas de chão rosado pela florada dos ipês, eu observo um fio muito sutil, mas forte, de algo que poderia ser esperança, ou talvez até paz. 

É sim um tempo de estiagem, as friagens e os adeuses ainda roubam a luz e o calor dos corações,

No entanto, a manhã de domingo em que se desperta como riso abundante das crianças, o canto dos pássaros e o cheio do café fresco me faz pensar nos tempos em que havia fé nos anjos, nos santos, no amor, na poesia. 

E não sei se são passados esses tempos de milagres, não sei se anjos, santos e poemas ainda têm algum poder de curar essas terras enfermas, mas sei que algum tipo de amor resiste, porque é ele que faz as crianças sorrirem, os pássaros cantarem e os ipês florirem. 

2 de jul. de 2021

02/07/2021


Rende-se o azul-safira do céu ao onix brando, frio e estrelado. 

Tamanha escuridez...

Desabaram das nuvens os castelos seguros da infância, e como um alquímico em busca do impossível, depuramos lascas de realidade afoitos por alguma beleza.

A noite se faz sem encanto, feito a pequena flor de lavanda que perfumava muito suavemente as horas tristes de mais uma tarde de despedidas.

E após a Deus, é diante das palavras que me ajoelho em busca do consolo.

Outro pranto, outro adeus.

Outra luz de sorriso que se apaga, outra estrada nunca mais cruzada. 

Que dizer dos laços inquebráveis do amor quando o amor para quase sempre se cala? 

Outro pranto, outro adeus...

E Deus em seu santo silêncio e as palavras que fluem ralas, insossas.

Que dizer sobre as mãos que não serão mais dadas?

Desconfio que nem algum grande poeta saberia.

Só que há alguma relíquia oculta na alma entoando uma canção sobre dias serenos. Sim, há.

E percebo que então a voz de Deus se mistura à voz de todas as coisas, e ela ecoa;

E as palavras tentam, insistem mais uma vez, mesmo em sua profunda modéstia, em acariciar com ternura o passar lento e dolorido dos dias.

1 de jul. de 2021

01/07/2021


Bethânia me canta seus breus, 

E eu, sempre em fuga e ao encontro dos meus,

Me lembro: o perfume amadeirado, o sol poente, as mãos livres parindo versos carentes de sentido e até de beleza, porém cheios de ternura. 

E tudo isso que havia depois que o amor não mais existia, não deixava de ser amor, só que menos brilhante, mais inquebrável, menos ausente. 

E pelas ruas há quem sorria, e eu mergulho em suas vozes, em suas mãos pelos cabelos, em suas pernas sobre o caminho, nos sonhos que imagino para eles e para mim. 

Mas como falar às almas se a minha ao menor tremor se cala? 

Minha voz serena contra corações bravos como rochas...

Como falar dos velhos lumes, das noites frias derrotadas por um instante de ilusória comunhão, se eu já suguei até o tutano das memórias, das flores, da chuva e do sol?

Já recosturei cada trapo de utopia trazido pelo ar nessa colcha fria e feia de retalhos. 

E ela se estende flutuando por todas as ruas, por todos os becos agora vazios e desencantados...

Enquanto eles voam, eu afundo há meses e meses junto das mesmas canções, 

Enganando a mim mesmo quanto ao valor dos tesouros submersos que ainda encontro.

E volto à tona,

E finda a canção.

Não resta muito a dizer por não haver muito a sentir. 

Melhor assim,

Talvez.