4 de mar. de 2015

Bons tempos



Todas essas folhas ao vento, ainda em branco;
E os dias sem qualquer promessa: também vazios;
Também as memórias, já pálidas, fracas... inservíveis;
Todas as eternidades tão efêmeras, superficiais, rasas...
Eis o que me assombra, o que me caça.

De que vale ordenar versos e louvores à maciez
tão meiga daqueles cabelos negros encaracolados?
De que vale a exuberância generosa da roseira,
cujo vermelho vivo lembra a beleza do olhar que não mais será visto?
Parece pesado demais este fardo de tanto sentir...

Mas estes são os bons tempos.
Tempos em que a voz forte ainda ecoa pelos labirintos abandonados da alma, 
arrancando-lhe ecos e suspiros;
Tempos em que o luar reluz como um convite para mergulhar de braços dados na docilidade estrelada da noite.

Estes são os bons tempos.
Em que o pulsar do músculo mestre ainda pode ser descompassado por um sorriso;
Em que a sensibilidade ainda é aguçada, como um faminto felino selvagem.
Em que os olhos ainda brilham, ora de paixão, ora de dor.

Bons tempos, em que os ossos ainda fortes, suportam as pancadas,
E após se partirem, recuperam a firmeza, a força. 
Em que o espírito ainda voa nos ombros de quimeras aladas, tão corajoso,
Ignorando que por elas pode e certamente será devorado. 
Tempos... em que ainda resta insanidade suficiente para crer no amor.