21 de abr. de 2023

Canto de Ossanha



Um dia então você saiu a navegar

E jamais retornou 

Jamais voltou outra vez

Seu olhar para a costa 

E era agosto 

E foi então sempre agosto desde então

O mesmo inverno 

O mesmo ex-voto sendo esculpido 

O órgão nunca curado

O mesmo tempo inverso 

Correndo como que para trás 

À tua busca 

A mesma discreta loucura contida 

Revivida hora após hora

Enquanto

O vento salgado do porto corta a pele

Fere os olhos 

Racha os lábios finos 

E nada no horizonte 

Nada 

Nunca mais 

Apenas a linha de pálido azul 

Sem vida 

Tão contrária ao seu magnífico azul 

Repleto de promessas e utopias 

Nunca mais 

Ditas ou a mim oferecidas

Mas seu canto 

Canto de Ossanha

Entoando peito adentro

Por dias

Meses

Anos

Eternamente 

Quando o coração é incapaz de se jogar novamente

E crer novamente 

Porque nenhum abismo será profundo o bastante 

Será belo o bastante 

Já que ainda me lembro 

Tão bem e dolorosamente 

Do breve mergulho 

Na vastidão incomparável da sua alma.