Um dia me disseram que as nuvens eram de algodão.
E eu sonhei por tanto tempo subir nas porteiras e árvores de manga e poder comer nuvens rosadas e doces.
Mas então descobri que todas estavam distantes demais, e eram brancas ou negras, e não eram de algodão, e não poderiam ser comidas.
Desisti de comer nuvens.
Um dia me disseram que eu poderia voar se esse fosse meu desejo.
E eu sonhei poder atravessar a cidade quando a noite lhe banha de estrelas e luzes, e bailar com brisas e zéfiros.
Mas então eu descobri que por nada eu conseguia levantar um centímetro do chão, e descobri que as madrugadas são perigosas e que se deve trancar todas as noites portas e janelas.
Desisti de voar.
Um dia me disseram que uma oração muda qualquer coisa.
E por entre lágrimas derramas pela dor de uma fé que queimava tanto, andei pelos cômodos implorando por um sinal, um som, um toque.
Mas então percebi que as guerras a meu redor não estavam cessando e que a única solução era correr.
Desisti de orar.
Um dia me foi dito que a coisa mais maravilhosa do universo era a imaginação.
E eu construí mais mundos e jardins que se possa somar. Eu corri ao lado de tantos seres encantados, eu cavalguei por tantos reinos, eu conjurei tantas magias.
Mas então descobri que nada era real (mesmo parecendo tanto!).
Descobri que em algum momento tudo isso deve ficar para trás, ou o mundo não te aceita de volta, ou o mundo te repele.
Desisti de imaginar.
Um dia me foi dito que é necessário ter heróis.
E eu amei tanto os que encontrei! Eles, tão distantes e perfeitos, olhavam com tanto carinho para mim! Os busquei a cada instante e fiz de mim uma parte deles. Eles me salvaram... eles me salvaram.
Mas então fui olhado com olhos estranhos, como se eu estivesse agarrado a uma estátua de gesso morta, enquanto apenas eu via ao redor do meu corpo centelhas de Deus sorrindo.
Desisti dos que me salvaram.
Um dia me foi dito que tenho uma vida toda para me encontrar, que nunca é tarde demais.
Mas então descobri que não é de bom tom ter muitas dúvidas, que o tempo ruge como fera faminta. Que deve-se ser rápido, prático, produtivo e útil às pessoas.
Desisti de questionar.
Um dia me disseram que a coisa mais importante que se pode aprender é apenas amar, e em troca, amado ser...
Amar...
Amado ser...
Sinto que ainda tenho ar em meus pulmões, sangue em minhas veias, coração que pulsa no peito.
Percebo que disso ainda não desisti.
Eu ainda não desisti,
Pois ainda estou vivo.
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