Deixar para trás as ruas daquela cidade foi de uma paz espiritual tão grande... Pois que antes, entre e atrás de tantos muros, luzes e concretos, ainda resistia um pequeno arbusto, um emaranhado de memórias, ilusões e esperanças, mas que por fim, já não existe mais.
Nosso coração habita onde o amor resiste, e depois que você foi embora não havia o que amar naquele lugar.
Tenho evitado falar de você. Não apenas porque tudo foi se desintegrando com o passar dos anos e "você" se tornou apenas uma ideia, uma expressão de algo maior, mas porque "você" implica em uma pessoalidade que não faz sentido mais.
Mas passando por aquelas avenidas frias, por aquele sufoco cinza de um lugar onde a noite já estende seu manto às quatro da tarde, eu tentava olhar em cada um das centenas de rostos, imaginar sua história, seu cansaço, sua dor nas costas, nos pés, nos caminhos que ainda percorreriam, no tempo até enfim poder colocar a chave na porta de casa. Eu me imaginada vivendo aquelas vidas, aquelas histórias que eram tão opostas e tão idênticas à minha. "Você" voltava a ser você.
Eu não precisava mais te desmistificar, tirar seu pedestal, seu trono. Eu fui por tanto tempo seu trono, seu pedestal. Para mim você era tudo, para o mundo, mais um.
Quando eu fui embora Adele cantava para mim. O frio e a garoa embaçavam as janelas e eu sentia finalmente que não deixava nada para trás. A sensação era de voltar para o sol, voltar para mim mesmo, e talvez essa forma de amor tão calma e humilde, sem estardalhaço, seja a forma mais genuína de amor possível.
Profundo...
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